Há alguns anos um pequeno número de pessoas fundou em nossa cidade a APADA - Associação de Pais e Amigos dos Deficientes Auditivos. Era um número insignificante de pessoas, algumas tinham filhos com deficiência auditiva, outras, como nosso saudoso Gilmar de Antonio de Cota, tinham membros da família com outro tipo de comprometimento.
Com o passar do tempo, outras pessoas, que não tinha filhos ou irmãos deficientes, mas que, por pura paixão, ingressaram na APADA. Entre elas estava Jairo, nosso saudoso prefeito, um jovem que podia muito bem, nas suas horas de folga, procurar a turma de amigos, marcar uma farra ou ir namorar, mas não, ele, como também Zildo de Sousa, Alda, Zenite e algumas outras, partilhavam idéias e corriam atrás para alcançarem o tão sonhado objetivo: A integração dos surdos na sociedade pombalense. Acreditávamos que os comerciantes empregariam nossos meninos.
Naquela época havia um prefeito que abriu as portas para APADA. Tinha um coração benevolente, caridoso e bondoso. Nego Chico. Homem simples.
Falávamos de nossos planos, dos nossos anseios: um prédio exclusivo para nossas crianças, contendo salas com piso acústico onde as aulas seriam ministradas e nossas crianças sentiriam tudo nas solas dos pés. Nego Chico nos ouviu com muito carinho. O prédio foi arquitetado, construído, mas não concluído. O mandato dele chegou ao fim.
Enquanto isso, os membros da APADA, com muita dificuldade, elaboravam projetos na tentativa de, em contato com outras entidades, adquirir “varas” pra ensinar as nossas crianças a “pescar”. Foi assim que, cada membro sugerindo e tendo sua participação, foi elaborado e aprovado em uma entidade da Alemanha, o projeto que trouxe para nossas crianças máquinas de costura, mesa de serigrafia e todos os assessórios possíveis. Cursos de corte e costura, pintura em serigrafia, dentre outros.
Os anos se passaram e a mudança de prefeito demoliu nossos sonhos.
Veio mainha, depois painho...
Foram tantas as dificuldades que um dia resolvemos fechar a APADA.
Lembro-me da tristeza no rosto de cada um e, igualmente, dos que visitavam com intuito de colaborar com suas idéias.
- Se agüentássemos passar esse mandato... Quem sabe o próximo prefeito não nos ajudaria? Balbuciavam alguns.
- Mas todas as máquinas conseguidas junto à organização não governamental da Alemanha, onde iriam funcionar? Não era justo ficarem paradas. Onde colocaríamos nossas crianças para aprender uma profissão? Tínhamos planos de vender os produtos, fabricados por eles, aqui na cidade. Como não tivemos apoio, tínhamos que decidir.
Idéias foram dadas, tentativas feitas e portas foram fechadas.
Uma solução foi tomada: entregaríamos as máquinas a Margarida. Margarida dirigia o Clube do Menor Trabalhador. Já tirava as crianças da rua e lhes dava dignidade. Muitos hesitaram, era nossa associação, era um sonho sendo demolido.
A tristeza envolveu Gilmar. Algum tempo depois ele veio a falecer. Estávamos todos em seu sepultamento, chorando a perda daquele que lutou tanto para ver, não só seu irmão, mas, as pessoas especiais do nosso município com dignidade e respeito. Pra mim, Gilmar é uma estrela que brilha.
Pombal sem APADA. APADA sem Gilmar.
Anos depois, mais uma estrela foi chamada a brilhar mais alto, era a vez de Margarida, além de perfumar nossos jardins foi chamada a nos ofuscar lá do alto. Muitas crianças ficaram órfãs. Lá estávamos nós em seu sepultamento. A dor de perder Margarida foi como a de perder uma irmã. Para muitas crianças foi a dor de perder uma verdadeira Mãe.
Pombal sem Margarida. Meu Deus, o que esperar de bom dos próximos anos? O que o destino nos reserva?
JAIRO FEITOSA PARA PREFEITO! ELEITO.
Até onde sei, nunca sonhou ser vereador, quiçá prefeito. Não sei se antes disso tinha votado em Zildo de Sousa, nosso companheiro de luta, ou em Magarida, sei que teve seu coração tocado por uma luta a que poucos comoveram.
Nossos sonhos foram realizados! Aquele prédio construído na gestão de Nego Chico, que até então estava abandonado, Jairo restaurou. Nossas crianças deficientes tinham uma escola especial, com professores capacitados, fonoaudiólogos, transportes, e tudo que os membros da APADA sonharam. A escola especial estava sendo “a menina dos olhos” de Jairo.
Eu pensei em gritar: Gilmar, Margarida! Jairo agora é prefeito. Está realizando nossos sonhos, concretizando nossas idéias... Será que eles iam escutar?
Dia 26 de setembro de 2007, estava em João Pessoa recuperando-me de uma cirurgia, quando acordei com meu celular tocando, era meu filho Shalako, a quem tantas vezes deixei trancado em casa, cuidando de Shalom, seu irmão do meio, para que eu pudesse ir às reuniões da APADA.
- Mainha, Jairo morreu.
Não acreditei, não podia ser verdade!
Liguei a TV e logo ouvi a manchete: MORRE em acidente automobilístico o prefeito Jairo de Pombal. Por um momento esperei... e percebi que mais uma estrela foi chamada a brilhar no firmamento.
Não foi só Jairo Prefeito de Pombal que morreu. Morreu Jairo irmão, amigo, esposo e filho. Homem simples e humilde. Um jovem que poderia estar usufruindo com sua esposa, filho e irmãos do status que lhe convinha, mas não, ele estava na luta por dias melhores, não para ele, mas para aquela classe menos favorecida. Ele não era mais voluntário pra ir falar com o prefeito. Ele era o próprio prefeito. Era ele quem estava agindo, buscando junto ao governo do Estado, junto ao Presidente da República o que tanto almejávamos. A dor foi grande porque sabia do ser humano que estávamos perdendo. Sabia do amigo que estava indo brilhar aonde só chega quem não tem medo de amar o próximo, de abraçar os pobres, de sorrir para as pessoas em sua volta.
Há quem pergunte como Jairo conquistou a tantos em tão pouco tempo e eu respondo: Jairo teve a humildade de se colocar como o mar, alguns centímetros abaixo de todos os rios, dos poderosos. E, como soube captar apenas o melhor, tornou-se um grande homem.
E eu não estava aqui para ir ao sepultamento dele, juntamente com todos que o amavam.
Por Francicleide Sousa (Dólar)
Fonte: Informativo Independente “A Guilhotina” (2ª ed., janeiro/2008)
Há alguns anos um pequeno número de pessoas fundou em nossa cidade a APADA - Associação de Pais e Amigos dos Deficientes Auditivos. Era um número insignificante de pessoas, algumas tinham filhos com deficiência auditiva, outras, como nosso saudoso Gilmar de Antonio de Cota, tinham membros da família com outro tipo de comprometimento.